Vamos conversar?

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sábado, 4 de dezembro de 2010

COLCHA DE RETALHOS: o remendo, o vento, o tempo.



Reassisti um filme que me marcou muito na época e sempre quis assisti-lo de novo! Eu e meus filmes inspiradores... Diria que é um clássico dos tempos modernos. Do tipo que você assiste e não esgota nunca as “N”possibilidades de tirar dele uma nova leitura. COLCHA DE RETALHOS.

O filme conta a história de uma moça que, retornando ao seu berço original, a casa aconchegante a da avó que a criou, enquanto sua mãe louquinha saía pelo mundão por aí, convive com as mulheres da sua infância. O tempo todo traçando paralelos das mulheres que enxergava, enquanto menina, com as que via agora.


Embora tenha a aparência de uma pessoa com valores próprios, revela o quanto tem impregnado nela a soma dos modelos que teve durante sua vida. E amor não era algo para se ter para sempre. Não conseguia fincar raízes!

O roteiro se desenvolve tendo como pano de fundo, a costura coletiva de uma colcha de retalhos que lhe será presenteada pelo seu casamento. Isto lhe assusta e a intriga. Pois significa uma junção de histórias de amor já acontecidas e vividas por cada uma das que a costuram, as mulheres de sua infância. E, muito mais profundas do que simplesmente o desfecho, do sim ou do não, revelam a sinceridade, a voracidade, a intensidade de cada amor vivido. E imperam, afirmam: existiram! Não importa o que se deu com ele depois…

Existe uma cena linda, creio eu, uma das mais marcantes de todo o filme que é quando uma brisa vem nascendo e acordando cada uma das mulheres. Digo, acordando de sua adormecida existência. A brisa vira vento que vira um revoar de páginas e mais páginas de uma história que ela escrevia em sua tese de mestrado. Existe toda uma simbologia nestas cenas. E o mais interessante e gostoso é ver que a cada vez que assistimos a estas cenas, esta revoada representa para nós diferentes coisas.

Toda vez que sinto o ventinho em meu corpo quando estou caminhando em algum lugar e vejo folhas sendo arrastadas pelo chão e esta existência invisível e tão real me empurrando o corpo, me bagunçando o cabelo, tenho certeza de coisas invisíveis serem tão fortes ou mais fortes do que aquilo que se vê! Você não pode enxergar o vento, mas vê tudo que ele causa, tudo o que ele é capaz de mexer. A força daquilo que não se vê... As folhas são levadas para os ares! E várias indagações pipocam dali. Juntar tudo de novo, ou quase tudo, o que for possível e recomeçar? Fazer os remendos necessários? Usar a memória a seu favor para costurar os vácuos? Reestabelecer a ordem... ou criar uma nova? Jogar tudo fora e começar nova história? Ir pelo caminho mais difícil ou procurar o mais fácil?

Nessa revoada de folhas/cenas escritas, várias destas mulheres recolhem as folhas que chegam até elas. Pois sabem o que elas são: a tese de mestrado da neta de sua amiga. O que não sabem é que aquelas páginas carregam em si, muito além do que palavras soltas ao vento! São elas mesmas que estão retratadas ali! Suas vidas, seus amores! A tese fala sobre a confecção da colcha de retalho. E, inevitavelmente, acaba falando da história de cada uma. O que acontece, então, é uma revolução! O ter as palavras registrando o acontecido resgata com tal intensidade os sentimentos adormecidos fazendo pular de dentro delas mesmas as pessoas que elas esqueceram que eram! E cada uma possui uma imagem que representa a sua essência. E, colhendo no pequeno laguinho do jardim de sua casa, construído pelo seu grande amor, uma delas redescobre que nunca deixou de ter em si a grande paixão de saltar em trampolim na água. De amar a água. Numa viagem pelo túnel do tempo, os passos são dados para retomar e ver o quanto é possível voltar a se ter aquilo que é tão importante a ela.

O vento é um impulso invisível necessário para se deslocar as certezas do lugar. Nalgumas vezes, são apenas folhas secas caídas no chão. Noutras, são raízes inteiras de árvores centenárias. Depende a intensidade do vento. Depende o quanto as raízes estão aprofundadas e seguras. Depende o quanto ainda há de seiva de vida correndo nela. O vento desloca certezas tanto quanto provoca o caos. Levanta saias de mulheres distraídas. Bagunça o cabelo, incomodando ou brincando. Depende de como se recebe a brincadeira do vento. Permitindo-se sentir o prazer de se deixar levar por ele, na dança frenética que os cabelos fazem, ou aborrecendo-se por não ter mais o penteado intocado. É preciso ser intocável?

O vento é, descaradamente, invasivo! Sim! Não pede licença. Não respeita limites. Não se atém a regras de aqui, sim, ali, não! É democrático. Atinge todos os lugares, à hora que desejar. O quanto quiser alcançar. Não há quebra ondas que os segure. Não há imitadores que o substitua. O ar condicionado refresca, mas não nos faz viajar nas suas asas. O vento é o retrato mais próximo do amor. Tanto é invisível quanto é existente! Dosa intensidades na vida da gente. De leve brisa à furacão. Nos faz experimentar a mais infinita e antagônica variedade de sentimentos. Doçura. Volúpia. Serenidade. Medo. O deixar levar. O querer fugir. A ir ao som do vento. O correr contra, insistindo, duramente, ao não tê-lo a seu favor. Ele limpa, purifica, leva sujeira embora. Ele traz poeira alheia. Ele leva sementes, frutifica, multiplica. Ele derruba árvores pela raiz.  Faz germinar. Faz morrer. Abala estruturas, certezas. Solidifica e fortalece o que se mantém.


O vento casado à colcha de retalhos nos oferece uma grata oportunidade de passar um tempo vendo a vida passar na tela quando, seguramente, cada espectador pode ver-se numa das pequenas peças da colcha, tendo como moldura sua própria história de amor e enxergando-se circundado pelas tantas, tantas forem as pessoas com quem se permitiu conviver. E o vento, ah... o vento vai passar a tocar de uma forma diferente. Difícil não ver as folhas passando a sua frente, carregadas pelo vento sem ter o lapso, o flash de pensar... Para onde???

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