Vamos conversar?

Vamos conversar?

domingo, 28 de julho de 2019

Coisas simples


Caminhos…
O tempo todo, estamos no caminho.
O passar por ele que diferencia as sensações, os aprendizados. As percepções de cada passo.



Estou num lugar muito especial e o caminho para cá, desta vez, foi muito especial, também. Passar pela estrada, seja asfalto ou terra, na velocidade do empurrar de pernas no pedal, cadencia o passo com o coração. Tuntum. Tuntum. Você estica. Você desapressa. Você vai feito montanha russa em descida, brincando arteira de pegar carona no vento e vai. Rasga um sorrisão no rosto. Rasga a bochecha de tanto rir de feliz. A liberdade vem em pacotinhos sem rótulo, só pra você descobrir, ao vivo, por onde está, pra você ir.



Na estrada, me pego em todos os meus formatos. Cabisbaixa, concentrada no passo da pedalada, suor escorrendo feito lágrima, no esforço de vencer a subida que tenta me fazer desistir. Nem vem, Senhora Subida! Você não me assusta! Eu sei que a qualquer instante, você acaba. Logo vem a sua irmãzinha arteira, que brinca comigo, me fazendo descer sem juízo, por ela, sem fim.



Na estrada, estou o tempo todo, sentimentos à flor da pele. Olhos aguçados, antenados com sons, cheiros, luzes. Recebo, desinteressadamente, os presentes que vêm. Não acelero o suficiente ao ponto de não poder ver o lado, o arredor e, pondo o pé no chão, ficar. Só pra ver o entardecer. Este tempinho onde tudo parece parar só pra assistir este jogo de luzes, sombras, em que ele se esconde.



Mergulho com ele. Um dia indo. Chamando a noite de meu bem.

De qualquer forma, percorrendo o caminho até o fim de faz de conta, o fim por hora, o fim pra hoje, ainda há presentes mais reservados. A noite dormida seria bivacando (A modalidade de dormir acampado, sem barraca. Apenas com o saco de dormir). Aquela velha frase que todo cicloviajante raiz conhece bem… "Tem um cantinho só, uma varanda, um pedaço de teto, um coberto, só por uma noite pra eu dormir? 



E a estrada que era pra ter sido pega bem cedo, pela manhã e que iniciou após um inédito momento de preparar a bike da Ana para a CicloTrip, bagageiro e bagagem, iniciou tarde. Bem tarde. Faz mal, não. Estávamos na hora certa, no lugar certo para o espetáculo. E a noite, nesta mesma hora certa, teve casinha às margens do lago nos esperando. Por puro capricho do tempo. Que sabia como fazer direito o que parecia torto.

Este tempo é mesmo muito arteiro.



Agora, um dia inteiro, ou meio para ficar aqui, ouvindo barulhinho de água caindo no lago. Galinha da Angola dizendo "Tô fraca, tô fraca, tô fraca, tô fraca". Perus passeando livres glugluzeando. Senhor Peru Branco se achando pavão, dono do pedaço, desfilando exibido se emplumando. Tina & Cia pedindo comida roubada debaixo da mesa, pra depois, sábia e prosa como é, se esticar no solzinho da manhã, debaixo da janela… E, ainda, vendo o revezamento da mesa do café dos passarinhos. Os convidados da casa, como diz o João. 



O tempo é sábio. Sábio é desapressar-se e ficar aqu, num ócio de fazdeconta que faz tudo pra mim.







terça-feira, 9 de julho de 2019

O tempo



O tempo não obedece lógicas.
Não possui regras absolutas.
Não cabe na rasa previsão dos porquês.
Por isso, acredito em surpreendentes histórias que ele inventa.
Não saberia criar enredos que ele cria.
Não escolheria personagens com sua perspicácia.
Não saberia inventar continuidades, nem interrogações. Que sugerem, mas não revelam, totalmente, seus fins.
Não teria a destreza de manter a vida como uma caixinha de surpresas.
Não saberia imaginar todas as surpresas que a vida me apresentou. E não saberia me preservar esperanças que me alimentou.



A vida vai passando da metade e uma avalanche de sentimentos escorrem as paredes por onde passo.
Várias verdades vão pulando pra frente de mim!
Vários momentos de "Eu mereço!" e de ser justo e sincero comigo mesma.
Tempos de abandonar verdades alheias e abraçar as minhas, tão somente minhas.
Tempo de renunciar certezas absolutas e me entregar para a dúvida e a incerteza de tentar o que não tentei, de me permitir erros, me permitir tentar aquele caminho que queria e que em outro tempo, não optei, fugi, abandonei, como se fosse dar certo ir por outro que não escolhi. Apenas fui. E segui.
Tempo de me permitir erros. De poder pisar em solo movediço! Destes que não me dá segurança nenhuma, estabilidade alguma, não me dá certezas de poder sair dali. Mas que me permite justamente aquilo que ele tem de sobra… Mover. Tudo aquilo que ficou adormecido em mim.



Este tempo depois da metade da vida é ousado e, ao mesmo tempo, de uma absoluta lucidez! Porque é quando deixamos cair nossas máscaras, nos despimos dos personagens tantos que pensamos ser quem somos. E, assim, nus e de cara lavada, damos de cara com o que verdadeiramente somos. E, na corrida desapressada que iniciamos, leves, de riso solto e passos certeiros, vamos.

O tempo não nos assusta mais. Nem nos dá mais a nostálgica sensação do não feito. Tudo foi feito. E tudo pode ser feito ainda. A possibilidade é a maior certeza do tempo.