11/11 Dia que Dona Estela disse adeus. Foi descansar. Não acho que tenha desistido de viver. Apenas estava fraca demais pra continuar e se deixou ir pra descansar.
Datas são fatídicas. Quando algo acontece numa data, ela se veste pra sempre com um nome, um cheiro, uma roupagem. 11/11 guarda o niver de três pessoas da minha vida. Três Erres. Rose, Rosana, Rogério. E há nove anos atrás passou a ser o dia do descanso da minha mãe. E que falta eu sinto dela no meu profundo egoísmo de querer ter ela ainda comigo!!!
Ela vinha sofrendo tanto ao longo de dois anos, que eu no alto da minha maturidade de filha que ama e entende que há um tempo para cada um e que existe o tempo de deixar ir, fui lá do ladinho dela conversar. Bem juntinho… Seus olhos falavam sem a voz falar. Olhos sofridos mas que me sorriam sem sorrir. Era uma conexão muda. Desnecessário a conversa por meios habituais. Eu falava, ela escutava. E consentia no olhar. Falei a ela sobre uma a uma de suas filhas. Nós. As quatro filhas da Dona Estela.
Parecia que ela precisava ouvir isso! O que cada uma fazia. O caminho que cada uma trilhava. E que estavam bem!
Uma a uma, falei à minha mãe da desnecessidade dela se preocupar conosco. Que estavam todas encaminhadas. Como se fosse necessário dizer. Acrescentei dizendo que eu e a Mariza ainda correríamos juntas um dia. Isto, eu cumpri. Só não consegui cumprir a outra parte da minha promessa para ela descansar sobre mim. Não, mãe. Ainda não vivi outra história de amor que falei à senhora que viveria. Ela sabia bem da história do meu grande amor vivido. E sabia de mim, tão bem quanto eu mesma. Ou mais…
Ela me olhava com olhos fixos em mim, como se me dissessem que era isto que ela precisava ouvir. Poucas horas depois, enfim, descansou. Penso eu, que se preocupava tanto com cada uma de nós, que não queria ir. E ouvir de mim sobre cada uma, lhe deu, de uma certa forma, um alívio. Que tudo ia dar certo, mesmo que ela precisasse sair de cena pra descansar...
Ela me olhava com olhos fixos em mim, como se me dissessem que era isto que ela precisava ouvir. Poucas horas depois, enfim, descansou. Penso eu, que se preocupava tanto com cada uma de nós, que não queria ir. E ouvir de mim sobre cada uma, lhe deu, de uma certa forma, um alívio. Que tudo ia dar certo, mesmo que ela precisasse sair de cena pra descansar...
Minhas irmãs seguem o caminho dentro do conversado. Acima do falado com ela. Melhor. Ela estaria despreocupada sobre isso. Estaria feliz de conhecer seus bisnetos. Estaria com a cabeça branquinha como esteve nos últimos meses dela, quando deixou de pintar seus cabelos que sempre foram pintados naquele conjunto dela, de Dona Estela vaidosa, com roupas combinando, maquiagem impecável, aquela elegância que nenhuma de nós tem tanto como ela. Por mais que cada uma tenha seu jeito especial de ser.
Que lembranças tenho dela? Seus diversos modelitos de cabelo. Estela pianista. Estela violinista. Estela tenista. Estela nadadora. Estela dançarina. Estela discretíssima e quieta. Mãe da sacolinha de plástico que ela sempre me dava com algo dentro. E que quando eu teimava levar estes algos na mão, corria ela até o portão com a tal da sacola na mão… “Põe na sacola!” me dizia ela. Eu resmungava e obedecia! Que falta me faz!!!
Mãe costureira que costurou meus primeiros biquínis! Roupas de revista. Das blusas lindas de tricô e que pacientemente ela me ensinou e, apesar de não parecer, sei fazer muito bem! Graças a ela! Dos quiabos que ela fazia só pra me agradar e chamar como isca pra eu ir lá, quando ela estava com saudade de mim! E não tinha coragem de falar claramente. Apenas ligava, naqueles telefones de verdade, que você fala e não manda mensagem, e dizia pra mim… “Fiz quiabo!”
Mãe desengonçada quando se tratava de demonstrar carinho. Não sabia! Não recebeu de criança, não sabia fazer. Não dizia “Eu te amo”. Mas eu sabia o quanto me amava.
Esteve doente por longos anos. De uma serelepe saudável que impressionava pela disposição, mesmo sendo uma senhorinha, adoeceu se tornando uma franzina senhora que se cansava fácil. Já não dirigia. E não se entregava, em hipótese alguma, à dor, a desistir, a deixar de viver.
Teve muitas dores. Aliviava-lhe o inchaço das pernas, a massagem que eu lhe fazia. Puro xodó pra ganhar um carinho gratuito, o toque que ameniza a dor. Muito mais do que qualquer medicamento faria! Aprendeu a pedir! Coisa que não sabia. Pois se eu por algum motivo, tentasse ir embora me esquivando de fazer sua massaginha nas pernas, ela dizia… “Não vai fazer massagem?”
A doença da minha mãe, aparentemente, a levou de nós. Mas na verdade, trouxe a de volta. Parou o tempo para resgatarmos carinhos não feitos, palavras não ditas, o convívio sincero, sem máscaras, intenso! Pudemos nos dar o melhor presente uma a outra: estar presentes! Todo dia. Todo tempo disponível. Fazendo o tempo ser disponível para isso. O mais importante. Estar perto de quem se ama, incondicionalmente.
Tenho certeza! Se estivesse viva, seria meu ninho ainda. De retorno, toda que me sentisse sozinha, insegura. Querendo apenas estar perto, quieta, de quem me compreende, mesmo que eu não diga nada. Estas linguagens que só o amor compreende.
"Mas na verdade, trouxe a de volta"
ResponderExcluirLindo isto!
Foi um tempo precioso... Um desacelerar nos ponteiros do relógio. Ou nos dígitos de hoje que só vão sem piedade à frente. Vivi mais intensamente com ela nestes seus últimos dias do que nos anos anteriores onde eu era prisioneira da correria...
Excluir2 Timóteo 4: 7. Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé. 8. Desde agora, a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, justo juiz, me dará naquele dia; e não somente a mim, mas também a todos os que amarem a sua vinda.
ResponderExcluirSim, Lucinei. Dona Estela combateu o bom combate...
ExcluirDe Sueli Almudi
ResponderExcluirPara aqueles que amamos, um "adeus" nunca é definitivo; na verdade, a despedida é apenas um "até breve", "a gente se vê", nem que por enquanto seja apenas em sonhos, orações e lembranças, que no começo são dolorosas; mas, com o tempo, o que era só sinônimo de dor se torna uma reflexão e se passa a permitir um sorriso de gratidão pelos momentos vividos, um sorriso necessário para continuar por quem só queria nossa felicidade. Seguir e ser forte é a melhor homenagem póstuma que podemos fazer. Uma alegria é sentida quando refletimos o tamanho do privilégio por ter compartilhado uma vida com alguém tão especial. O amor nunca morre. Ele não permite encerramentos, perdas, nem ciclos fechados. E nem mesmo o Céu é o limite. O amor vai aonde tiver que ir: ele sempre alcança o que muitos consideram impossível. O amor é o que mantém uma união, um elo e um laço, e não uma presença física. O amor não precisa de um olhar, de um toque para continuar existindo. O sentir tem essa função e cumpre bem seu papel. O coração enxerga cada detalhe, mesmo de olhos bem fechados...
Andressa Badin Castro
"O amor não precisa de um olhar, de um toque para continuar existindo."
ExcluirExatamente, Sueli. Existe e ponto.
Me emocionou muito lembrar dela lendo isso tudo.
ResponderExcluirEla também vai estar sempre viva em meu coração
Sinto tanta falta dela...
ExcluirQue lindo Suzi! Não teve como conter as lágrimas! Muito intenso, muito amor envolvido!
ResponderExcluirVocê sabe bem isso, né, minha amiga ... Bom ter tanto a lembrar. Faz a saudade valer à pena!
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